Quem não ama a solidão não ama a liberdade

Eu tenho um amigo que, toda vez que sente o peso do vazio e o medo da solidão, me envia uma mensagem. Talvez para lembrar a si mesmo que não está completamente só ou que é possível viver sozinho sem sofrer tanto por dependência emocional. Geralmente ele faz isso quando está alcoolizado, como se o álcool fosse a ponte entre o que sente e o que não consegue dizer.

Longe de mim querer ser um exemplo de espírito livre, alguém a ser seguido. Mas, honestamente, eu prefiro viver em paz sozinho do que insistir em relações onde apenas um lado carrega o peso. Relações em que alguém se entrega por inteiro enquanto o outro só usufrui, sem dar em troca o que torna um vínculo verdadeiro: mutualidade, respeito, entrega mútua.

O provérbio sufi diz: “No deserto, não tem nenhuma placa que diz: ‘não comerás pedras.’” E isso ressoa muito aqui. A vida, como o deserto, não traz manual de instruções. Não existem placas avisando que é insano insistir em algo que te machuca, que é insensato tentar se alimentar de algo que nunca será nutritivo. A escolha é sua. Você pode continuar engolindo o que não te faz bem ou escolher o vazio consciente da solidão, que cura ao invés de corroer.

A solidão é viciante

Se a solidão é meu vício, então ela é uma escolha consciente. Prefiro a minha solidão à presença de alguém pela metade. Talvez esse estado de paz – conquistado depois de tantas quedas – seja o que podemos chamar de felicidade real. Aquela que não depende de outra pessoa, mas de você mesmo.

Se você procura alguém para te fazer feliz, que sorte a sua se já encontrou. Segure firme essa pessoa, porque ela não está em cada esquina. Mas, se ainda não encontrou, não procure. A gente atrai aquilo que vibra dentro de nós. E se alguém estiver destinado a fazer parte do seu caminho, ela virá. Ou voltará. A vida tem mistérios que não nos cabe entender.

Eu não busco “metades”, porque acredito que somos inteiros. Não quero alguém para me completar; quero alguém que transborde ao meu lado. E a maturidade me ensinou que perder vínculos dói, mas o “para sempre” é efêmero. As pessoas vêm e vão, é da vida. Envelhecer ao lado de alguém é um privilégio – e poucos conseguem.

Então, escolha ser leve. Deixe as mágoas no passado, perdoe quem precisar ser perdoado, inclusive você mesmo. Não se desgaste com o que foge do seu controle. Hoje, eu já perdoei todos os que cruzaram o meu caminho. Estou em paz comigo e com o mundo.

O deserto, como a solidão, ensina. Não há placas, mas você aprende a confiar no seu discernimento. Aprende que às vezes é melhor caminhar só, do que aceitar qualquer companhia apenas para preencher um vazio.

Quem não ama a solidão não ama a liberdade

Há um tipo raro de ser humano que não teme o silêncio. Que encontra serenidade em estar sozinho num quarto, ouvindo seus próprios pensamentos. Essas pessoas não fogem da solidão porque entendem que é nela que se reencontram, que se reconectam com a essência e com o universo ao redor.

Elas não se deixam levar por qualquer companhia. Não trocam a paz da solitude pela presença de alguém incompleto. Porque, no fundo, elas sabem: solidão não entedia, ela vicia.

Nietzsche disse: “Não ouse roubar a minha solidão, se não fores capaz de me oferecer a real companhia.” E o provérbio sufi ecoa na mesma sintonia: no deserto, não há placas dizendo o óbvio. Você deve aprender a não comer pedras, mesmo quando o vazio parece insuportável.

A solidão é como o deserto: silenciosa, desafiadora e, ao mesmo tempo, sagrada. Quem aprende a caminhar por ela, descobre que o momento presente é tudo o que realmente importa. E isso, talvez, seja a verdadeira felicidade.

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch é escritor, dancarino, produtor de conteúdo digital desde 2015, formado em Letras pela Faculdade Capixaba do Espírito Santo (Multivix 2011-2014) e pós-graduado pela Faculdade União Cultural do estado de São Paulo (2015-2016).
Vasta experiência internacional, já morou em Dublin(Irlanda), Portugal, é um espírito livre, já visitou mais de 15 países da Europa e atualmente mora em São Paulo.
É coautor no livro: Versões do Perdão, autor do livro O Diário de Ayron e também de Breves Reflexões para não Desistir da Vida.

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