O avanço do extremismo e do autoritarismo no cenário global é um alerta claro de que a democracia está sob ataque. A reeleição de Donald Trump nos Estados Unidos, em 2024, simboliza a consolidação de um movimento que começou em 2016 e que continua a inspirar líderes populistas e antidemocráticos ao redor do mundo. Trump não apenas desrespeita normas democráticas, mas também utiliza a retórica religiosa e o apoio de setores conservadores como ferramenta para fortalecer sua base, uma estratégia que tem sido replicada em diversas nações, incluindo o Brasil.
Na América Latina, essa mistura de política autoritária e religião tem alimentado lideranças de extrema-direita que prometem ordem, mas entregam repressão. No Brasil, embora Jair Bolsonaro esteja tecnicamente inelegível, ele permanece como um símbolo da extrema-direita religiosa, enquanto seus filhos, Eduardo, Flávio e Carlos Bolsonaro, se apresentam como possíveis herdeiros políticos. Esses políticos exploram a fé e o discurso moral para mascarar agendas que atacam direitos fundamentais e enfraquecem as instituições democráticas.
A utilização da religião como um instrumento político é particularmente perigosa. Em vez de promoverem valores como solidariedade e justiça social, líderes autoritários manipulam a fé para justificar políticas que dividem, oprimem e desinformam. Essa simbiose entre política extremista e religião cria um ciclo de polarização que fragiliza as democracias e legitima discursos de ódio. No Brasil, isso é evidente no apoio de setores religiosos conservadores ao bolsonarismo, que frequentemente distorcem preceitos religiosos para defender práticas antidemocráticas.
O ex-presidente do Uruguai, José ‘Pepe’ Mujica, destacou recentemente ao portal AFP sua preocupação com o futuro do Brasil diante desse contexto. Para ele, a ausência de um sucessor político preparado por Lula (PT) representa um risco grave, especialmente considerando o crescimento de figuras autoritárias. “Sem uma liderança progressista forte, o caminho está aberto para os extremistas voltarem ao poder, algo que pode comprometer o futuro democrático do país”, afirmou Mujica.
Lula havia declarado, em 2022, que aquela seria sua última participação em uma eleição presidencial, sinalizando que não pretende concorrer em 2026, embora a legislação permita. Esse vácuo de liderança progressista no país preocupa líderes regionais, como Mujica, que vêem a América Latina cada vez mais vulnerável ao avanço do autoritarismo e ao uso da religião como arma política.
Mujica também teceu críticas ao autoritarismo que se espalha pela região, apontando que não se trata apenas de uma interferência histórica dos Estados Unidos, mas de uma responsabilidade interna. “O autoritarismo na América Latina não é apenas culpa externa; também estamos criando esse retrocesso”, declarou.
Sobre a Venezuela, Mujica não poupou críticas ao governo de Nicolás Maduro, que ele classificou como “regime autoritário”, negando qualquer relação com a esquerda progressista. “Esse governo não representa os ideais de Hugo Chávez. Muitos chavistas foram perseguidos e exilados”, afirmou. Ainda assim, Mujica se posicionou contra intervenções externas, defendendo que a solução para os problemas da Venezuela deve ser conduzida pelo próprio povo venezuelano.
O avanço de figuras extremistas, respaldadas por discursos religiosos manipulados, é um problema que transcende fronteiras e ameaça a estabilidade de diversas nações. Para Mujica, a única forma de combater esse fenômeno é por meio de lideranças progressistas sólidas e comprometidas com os valores democráticos, algo que, segundo ele, o Brasil ainda precisa consolidar. A conivência de setores religiosos com esses líderes autoritários, no entanto, é uma barreira que continua a dificultar o caminho para a preservação da democracia.