Jovem africano de 14 anos cria sabonete para tratar câncer de pele.

A cada geração, o mundo se surpreende com a capacidade dos africanos e seus descendentes de reinventar o presente e projetar o futuro. A história insiste em tentar apagar essa chama criativa, mas, vez após vez, jovens mentes surgem para provar que o berço da humanidade continua sendo também o berço da inovação. Em pleno século XXI, enquanto muitos ainda lutam contra o estigma e a desigualdade, um adolescente africano de apenas 14 anos conquista espaço nas páginas da revista Time e nas manchetes internacionais com uma invenção simples, acessível e promissora: um sabonete capaz de auxiliar no tratamento do câncer de pele.

O nome dele é Heman Bekele, nascido em Addis Ababa, na Etiópia, e radicado nos Estados Unidos desde os quatro anos de idade. Com uma infância marcada por lembranças de seu país natal e um olhar atento às dores de quem vive sob o sol intenso da África, Bekele transformou sua curiosidade em ciência. Aos 14 anos, conquistou não apenas o título de “America’s Top Young Scientist” no concurso da 3M, como também foi reconhecido pela Time como “Kid of the Year 2024”. Em um planeta que insiste em subestimar a juventude negra, especialmente quando ela traz consigo raízes africanas, a invenção de Bekele é mais que ciência: é afirmação de que genialidade e pertencimento caminham juntos.

O sabonete criado por Heman tem como objetivo combater um dos tipos de câncer mais comuns no mundo: o câncer de pele. Sua motivação nasceu de uma homenagem às pessoas que, como ele viu na Etiópia, trabalham sob sol intenso e enfrentam altos custos de tratamento. Ao notar que a doença atinge com força regiões em desenvolvimento, onde cirurgias e medicamentos estão fora do alcance de muitos, Bekele decidiu buscar uma solução simples, acessível e replicável. O resultado foi um protótipo de sabão especial, pensado para estimular o sistema imunológico da pele e fortalecer a luta contra as células cancerígenas.

Essa iniciativa, ao mesmo tempo singela e ambiciosa, ecoa uma tradição histórica: africanos e afrodescendentes têm sido responsáveis por contribuições decisivas à ciência, à tecnologia, à arte e à cultura global. Da astronomia de Timbuktu às invenções médicas de Imhotep, da resistência cultural de reis e rainhas às descobertas de cientistas contemporâneos, a história africana é feita de revoluções contínuas. Heman Bekele é herdeiro dessa linhagem. Aos 14 anos, ele não apenas inventa um produto inovador, mas inscreve seu nome na longa lista de africanos que transformam a humanidade, mesmo quando o mundo insiste em lhes negar reconhecimento.

O nascimento de uma ideia

O projeto de Heman Bekele ganhou força em sua escola nos Estados Unidos, quando ele decidiu se dedicar ao estudo das células dendríticas, peças fundamentais do sistema imunológico. Seu objetivo era encontrar uma forma de estimular essas células para que o corpo pudesse reagir melhor contra as lesões causadas pelo câncer de pele. Com orientação e pesquisa, ele chegou à ideia de usar um medicamento já conhecido — o imiquimod — incorporado a um sabonete. A inovação estava justamente na forma de entrega: transformar um tratamento caro e de difícil acesso em algo cotidiano, barato e prático.

Com essa proposta, Bekele venceu o 3M Young Scientist Challenge de 2023, recebendo US$ 25 mil para continuar sua pesquisa. Mais do que o prêmio, foi o reconhecimento da comunidade científica e o impacto simbólico de ver um jovem africano ocupar esse espaço que marcaram a conquista. Pouco depois, a revista Time o destacou como “Kid of the Year”, transformando-o em um rosto de esperança e inspiração para jovens cientistas ao redor do mundo.

Ciência, acessibilidade e futuro

O sabonete de Heman ainda não está disponível comercialmente e nem foi aprovado por órgãos reguladores como a FDA. Mas a ideia já é considerada promissora e vem sendo estudada em ambientes acadêmicos, inclusive na Johns Hopkins University, onde ele ganhou acesso a laboratórios para refinar os testes. Atualmente, parte da pesquisa inclui experimentos em camundongos, o que demonstra que o caminho ainda é longo, mas viável.

A maior preocupação de Bekele, no entanto, não é apenas científica, mas social: ele deseja que o produto final seja acessível às populações mais pobres, especialmente em países em desenvolvimento. Para ele, não faz sentido que a cura de uma doença tão frequente seja um privilégio de poucos. Essa consciência social transforma sua invenção em mais do que ciência: é um gesto de responsabilidade coletiva.

Um legado africano em movimento

Heman Bekele não é um caso isolado. Ele é a continuidade de uma África que sempre esteve na vanguarda, mas cuja voz foi abafada pelo colonialismo e pelo racismo. Hoje, ao criar um sabonete que pode salvar vidas, ele mostra que a criatividade africana não conhece fronteiras. A mesma chama que fez nascer o pensamento filosófico no Egito antigo, que impulsionou descobertas matemáticas em Mali, que ecoou nas lutas de Nelson Mandela e nas invenções de cientistas negros contemporâneos, agora se manifesta nas mãos de um adolescente que transforma barra de sabão em arma contra o câncer.

Aos 14 anos, Bekele já inspira não apenas por sua inteligência, mas por sua coragem de sonhar grande. Ele mostra ao mundo que os africanos não estão apenas respondendo a desafios locais: estão revolucionando o planeta, lembrando a todos que não existe futuro humano sem a contribuição da África. O sabonete pode ser apenas o início. O que Heman representa é muito maior: a certeza de que a criatividade africana, jovem e incansável, continuará abrindo caminhos para novas formas de viver, curar e transformar.

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch é escritor, dancarino, produtor de conteúdo digital desde 2015, formado em Letras pela Faculdade Capixaba do Espírito Santo (Multivix 2011-2014) e pós-graduado pela Faculdade União Cultural do estado de São Paulo (2015-2016).
Vasta experiência internacional, já morou em Dublin(Irlanda), Portugal, é um espírito livre, já visitou mais de 15 países da Europa e atualmente mora em São Paulo.
É coautor no livro: Versões do Perdão, autor do livro O Diário de Ayron e também de Breves Reflexões para não Desistir da Vida.

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