Critica: o homem de cor e a branca – Frantz Fanon

Ah, o amor! O sentimento mais sublime e universal que, aparentemente, transcende barreiras sociais e raciais. No entanto, será que essa noção de “escolha pessoal” e “gosto individual” realmente se mantém incólume quando falamos da relação entre o homem de cor e a branca? Bem-vindos à realidade, onde a construção social também influencia os nossos desejos. Neste texto, embarcaremos em uma jornada irônica e inteligente, à luz das críticas de Frantz Fanon, para examinar como as relações inter-raciais são permeadas por construções sociais e preconceitos velados.
Meus caros, não há como negar que vivemos em uma sociedade que molda nossos gostos e desgostos. Somos influenciados por propagandas, pela mídia, pelos padrões estéticos impostos. E não seria diferente quando se trata de amor e relacionamentos. Afinal, como diria Fanon, o amor também é um terreno onde os jogos de poder e dominação se desenrolam.

Quando um homem de cor se envolve com uma branca, muitas vezes somos levados a crer que é uma manifestação de igualdade e superação de barreiras raciais. No entanto, é importante questionar: será que essa escolha é realmente desprovida de influências sociais? Será que não estamos reproduzindo, inconscientemente, os estereótipos e os privilégios embutidos em nossas estruturas?

Fanon, com seu olhar sagaz, nos instiga a refletir sobre a ideia de “escolha pessoal” dentro do contexto social. Afinal, nossos gostos não são forjados em uma bolha isolada, mas sim alimentados pelos discursos hegemônicos que permeiam nossa cultura. Somos bombardeados por imagens de beleza, por narrativas que reforçam a supremacia branca e, assim, é difícil escapar dessas construções sociais.

Não estamos dizendo que todos os relacionamentos inter-raciais são baseados em estereótipos ou preconceitos. Longe disso! Mas é necessário reconhecer que nossa sociedade ainda é permeada por desigualdades raciais, que se manifestam de maneiras sutis e nem sempre perceptíveis. E é justamente nesse contexto que o amor entre o homem de cor e a branca se desenrola, carregando consigo uma bagagem histórica e simbólica.

A ironia é inegável quando nos deparamos com a forma como o homem de cor é muitas vezes objetificado, fetichizado, como se sua “exotização” fosse um sinal de avanço social. A branca, por sua vez, ocupa uma posição privilegiada nessa relação, beneficiando-se da imagem de superioridade que a sociedade lhe atribui. O amor, nesse contexto, torna-se uma espécie de teatro onde papéis sociais pré-determinados são encenados.

A questão da identidade racial tem sido um tema complexo e sensível ao longo da história. Em muitas sociedades, incluindo as contemporâneas, o racismo e a supremacia branca têm contribuído para a marginalização e a opressão das pessoas negras. Nesse contexto, é compreensível que alguns indivíduos negros possam sentir o desejo de pertencer ao mundo dos brancos, buscando assimilar-se a uma cultura hegemônica que valoriza a branquitude. No entanto, é fundamental analisar criticamente essa dinâmica e buscar uma abordagem que promova a autoaceitação, o orgulho e a emancipação da identidade negra.

A pessoa negra e a palmitagem.

A “palmitagem” é um termo controverso, mas que, levando em consideração o contexto histórico do Brasil enquanto país colonizado, adquire um significado profundo e revelador. Para compreender sua relevância, é necessário mergulhar nas raízes da colonização e na história de opressão racial que moldou a sociedade brasileira.

Desde os tempos da escravidão, o Brasil carrega consigo uma herança de brutalidade e desigualdade. Durante séculos, a população negra foi subjugada, explorada e tratada como mercadoria pelos colonizadores brancos. Esse período de exploração racial deixou marcas profundas na psique coletiva do país.

Além disso, é importante mencionar que o Brasil já teve um plano oficial de embranquecimento da população, conhecido como branqueamento. No início do século XX, intelectuais e governantes defendiam a ideia de que o país deveria buscar a miscigenação com o intuito de “clarear” a população e, assim, supostamente promover o progresso e a modernização. Esse projeto visava apagar as características negras da nação, perpetuando a marginalização e a inferiorização da população negra.

Nesse contexto, a palmitagem emerge como um reflexo de um sistema enraizado de opressão e de desvalorização da negritude. Frantz Fanon, um proeminente pensador e psiquiatra martinicano, descreveu essas relações afetivas entre pessoas negras e brancas como “aberrações afetivas” em sua obra “Pele Negra, Máscaras Brancas”. Ele apontou a forma como a sociedade racista influencia a subjetividade das pessoas negras, fazendo-as buscar a aceitação branca para se sentirem valorizadas.

Sob essa ótica, a palmitagem revela-se uma manifestação dolorosa dessa busca por aceitação, onde o indivíduo negro se vê compelido a renunciar à própria identidade e a rejeitar sua cultura para se enquadrar nos padrões impostos pela sociedade branca dominante. Essa atitude é reflexo da colonização interna que ocorre na mente dos indivíduos, onde a negritude é vista como algo inferior e indesejável.

Contudo, é necessário criticar e problematizar a palmitagem dentro de uma perspectiva social e cultural mais ampla. A ênfase na valorização da branquitude como um ideal de beleza e sucesso é uma consequência direta do racismo estrutural que permeia a sociedade brasileira. Essa valorização cria um abismo entre as pessoas negras e brancas, perpetuando a desigualdade e mantendo o status quo racista.

Portanto, é fundamental que, ao abordar o tema da palmitagem, olhemos para além das relações individuais e reconheçamos o contexto histórico e social que a sustenta

O contexto do desejo de pertencer ao mundo dos brancos

O desejo de pertencer ao mundo dos brancos pode ter origens variadas, desde a internalização de estereótipos negativos associados à negritude até a busca por melhores oportunidades e acesso a privilégios sociais. A construção histórica da supremacia branca e a imposição de padrões de beleza eurocêntricos têm contribuído para a criação de um ideal inalcançável para muitos indivíduos negros.

No entanto, é importante destacar que a busca pela assimilação a uma cultura dominante branca pode levar à negação da própria identidade e à perpetuação de um sistema de opressão. Esse desejo de pertencimento, muitas vezes, envolve abandonar aspectos da cultura e da história negra, resultando em uma perda da diversidade cultural e no enfraquecimento da luta contra o racismo estrutural.

Desconstruindo o desejo de pertencer ao mundo dos brancos

A desconstrução do desejo de pertencer ao mundo dos brancos envolve um processo complexo de autoanálise e empoderamento. É necessário compreender que a identidade negra é valiosa e digna de orgulho, em vez de buscar aprovação e validação externas. Aqui estão algumas estratégias para auxiliar nesse processo:

  1. Reconhecimento da história e da cultura negra: É essencial se aprofundar na história e na cultura africana e afrodescendente, valorizando suas contribuições para a humanidade. Isso envolve aprender sobre líderes negros, movimentos sociais, arte, literatura, música e demais manifestações culturais que ajudam a construir uma identidade forte e resiliente.
  2. Autoaceitação e autocuidado: Reconhecer e celebrar a própria identidade negra é um ato de amor-próprio. Isso inclui aceitar a cor da pele, os traços faciais, o cabelo e todas as características físicas que fazem parte da experiência negra. Práticas de autocuidado, como valorizar e cuidar do cabelo natural, podem ser formas de expressar o amor próprio e rejeitar a pressão para se adequar a padrões eurocêntricos de beleza.

Construção de comunidades de apoio: Buscar conexões com outras pessoas negras e engajar-se em espaços que promovam o fortalecimento e a valorização da Identidade negra é fundamental para o processo de desconstrução do desejo de pertencer ao mundo dos brancos. Encontrar comunidades que compartilham experiências e lutam contra o racismo pode proporcionar apoio emocional, empoderamento e a oportunidade de construir uma rede de suporte que promova a valorização da identidade negra.

  1. Educação e conscientização: A educação desempenha um papel crucial na desconstrução do desejo de pertencer ao mundo dos brancos. É importante buscar conhecimento sobre o racismo estrutural, suas manifestações contemporâneas e as formas de resistência e empoderamento da comunidade negra. Isso inclui questionar e desafiar estereótipos, ampliar a representatividade negra em diversos espaços e promover a igualdade de oportunidades para todos.
  2. Engajamento político e social: A superação do desejo de pertencer ao mundo dos brancos requer uma ação concreta na luta contra o racismo. Isso pode envolver o engajamento político, a participação em movimentos sociais e a defesa de políticas públicas que promovam a igualdade racial. É importante trabalhar em conjunto para construir uma sociedade mais justa e inclusiva, onde a diversidade seja valorizada e respeitada.

Conclusão

O desejo de pertencer ao mundo dos brancos é uma manifestação das pressões sociais e do racismo estrutural que afetam as pessoas negras. No entanto, é fundamental desconstruir essa busca pela assimilação e promover a autoaceitação, o orgulho e a valorização da identidade negra. A construção de uma identidade sólida, baseada na história, na cultura e na resistência da comunidade negra, fortalece o indivíduo e contribui para a luta contra o racismo. Ao buscar a autenticidade, os negros podem criar um mundo onde a diversidade seja celebrada e todos sejam respeitados em sua plenitude.

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Wanderson Dutch

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch é escritor, dancarino, produtor de conteúdo digital desde 2015, formado em Letras pela Faculdade Capixaba do Espírito Santo (Multivix 2011-2014) e pós-graduado pela Faculdade União Cultural do estado de São Paulo (2015-2016).
Vasta experiência internacional, já morou em Dublin(Irlanda), Portugal, é um espírito livre, já visitou mais de 15 países da Europa e atualmente mora em São Paulo.
É coautor no livro: Versões do Perdão, autor do livro O Diário de Ayron e também de Breves Reflexões para não Desistir da Vida.

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