Cresce o número de mulheres que optam pela abstinência de homens. Até 2030, estima-se que 45% delas estarão solteiras, aponta estudo.

Até 2030, estima-se que 45% das mulheres estarão solteiras. Esse dado, apontado por estudos de comportamento demográfico e social em diversos países, marca não apenas uma mudança estatística, mas uma transformação cultural silenciosa e radical no modo como muitas mulheres têm decidido viver. O que à primeira vista poderia parecer um “fenômeno social passageiro” é, na verdade, o reflexo de um cansaço histórico, de um despertar coletivo e de uma decisão consciente: muitas mulheres estão escolhendo a si mesmas.

Nos últimos anos, o número de mulheres que optam pela abstinência afetiva, emocional e sexual em relação aos homens vem crescendo em diferentes faixas etárias e contextos sociais. Essa escolha, que para algumas pode parecer extrema, tem sido para outras uma forma legítima de preservação emocional e física, um caminho para a cura, para o autoconhecimento e para a liberdade.

Quando o amor não basta: o peso da violência e da desigualdade

O ponto de partida dessa decisão, para muitas, está no acúmulo de experiências negativas em relações heterossexuais marcadas por abuso emocional, traições, sobrecarga doméstica, desrespeito, invisibilidade ou até violência física. Em 2024, o Brasil registrou 1.492 casos de feminicídio e mais de 87 mil estupros — dados que não são apenas números frios, mas histórias de dor, silenciamentos e medo que atravessam o cotidiano de milhares de mulheres.

É nesse contexto que a solteirice deixa de ser vista como ausência e começa a ser compreendida como estratégia de autoproteção e autonomia. Muitas mulheres relatam que, ao se afastarem de relacionamentos afetivos com homens, redescobriram a paz, o foco pessoal, o prazer de estar consigo mesmas, e a possibilidade de viver sem a constante vigilância ou adaptação ao desejo masculino.

Padrões afetivos elevados: menos tolerância, mais consciência

Outra razão que vem sustentando esse movimento é a mudança nos critérios afetivos. Mulheres de diferentes gerações estão cada vez menos dispostas a aceitar relações que não lhes ofereçam crescimento, reciprocidade, maturidade emocional e respeito integral. O tempo da submissão afetiva vem ficando para trás.

Essa nova postura não se trata de arrogância ou exigência exagerada, mas sim de uma elevação dos padrões. Ao contrário do que muitos discursos conservadores tentam impor, a mulher moderna não está “exigindo demais” — ela apenas deixou de aceitar o mínimo. O que para gerações anteriores poderia parecer uma relação “normal”, hoje soa como abuso ou descaso.

Por isso, a escolha pela abstinência ou pela solteirice não é, em grande parte dos casos, uma rejeição ao amor, mas sim uma rejeição à mediocridade emocional, à negligência afetiva e à violência naturalizada.

Não é solidão: é reconexão

Existe uma crença ainda muito forte de que mulheres solteiras são incompletas, solitárias, infelizes. Essa visão, baseada em um modelo patriarcal, ignora a riqueza das experiências vividas fora dos moldes do casamento ou da dependência afetiva.

O que muitas mulheres estão experimentando hoje é o oposto disso. Elas estão redescobrindo a potência de viver com leveza, com tempo para si, com liberdade de decisão, com conexão espiritual e criativa. Estão cultivando amizades profundas, criando redes de apoio entre mulheres, empreendendo, viajando, estudando, cuidando de si com prioridade.

Ser solteira, neste contexto, não é ausência de amor, mas sim redefinição da fonte desse amor. Ele não vem de fora. Ele não depende de validação masculina. Ele nasce do centro — e se expande em todas as direções.

Entre o celibato político e o descanso existencial

Para algumas mulheres, essa decisão de se afastar dos homens ultrapassa a esfera pessoal. Ela se torna uma escolha política, conhecida como “celibato político” — termo utilizado por autoras feministas como forma de denunciar e romper com estruturas de dominação masculina em todos os níveis, inclusive o íntimo. Essas mulheres entendem que não é possível se relacionar de maneira equilibrada com homens enquanto o patriarcado for a base da sociedade.

Já para outras, não há militância explícita. Apenas um cansaço. Um desejo de silêncio. Um anseio por descanso. Um entendimento maduro de que, neste momento da vida, estar sozinha é melhor do que estar mal acompanhada.

E o futuro?

Se os dados se confirmarem, e 45% das mulheres estiverem solteiras até 2030, isso não significará uma crise de vínculos — mas sim um redesenho das formas de amar, de se relacionar e de viver em comunidade. A estrutura do afeto está mudando. E as mulheres estão na linha de frente dessa transformação.

Talvez estejamos testemunhando o nascimento de uma nova cultura relacional: menos centrada em controle e dependência, mais voltada para o afeto consciente, a liberdade mútua e o respeito incondicional. E talvez, só talvez, ao deixar de buscar desesperadamente o amor nos outros, muitas mulheres estejam finalmente encontrando a si mesmas.

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch é escritor, dancarino, produtor de conteúdo digital desde 2015, formado em Letras pela Faculdade Capixaba do Espírito Santo (Multivix 2011-2014) e pós-graduado pela Faculdade União Cultural do estado de São Paulo (2015-2016).
Vasta experiência internacional, já morou em Dublin(Irlanda), Portugal, é um espírito livre, já visitou mais de 15 países da Europa e atualmente mora em São Paulo.
É coautor no livro: Versões do Perdão, autor do livro O Diário de Ayron e também de Breves Reflexões para não Desistir da Vida.

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