A verdade não vem da Bíblia, não vem de nenhum livro específico sagrado, não está em manual do bem viver, a verdade está em você. A verdade é você. Desde os primeiros sopros da infância, somos lançados em uma busca incessante por aprovação, sucesso e pertencimento.
Nos ensinam a ser bons, a seguir as normas, a cumprir expectativas que nem sempre escolhemos, mas raramente nos convidam a olhar para dentro. Quem somos além dos rótulos que nos impõem? Seria este corpo apenas um veículo temporário? E esse nome, que carregamos como um fardo ou um troféu, define realmente nossa essência? Para onde estamos indo, se sequer sabemos de onde viemos internamente?

Carl Jung, um dos poucos que ousou desbravar os abismos da mente humana, nos advertiu: “Até você se tornar consciente, o inconsciente irá dirigir sua vida e você vai chamar isso de destino.” Essa frase, simples em sua construção, mas avassaladora em sua profundidade, me provoca todas as vezes que a releio. Quantas vezes culpamos o destino por fracassos, perdas e desencontros, sem perceber que somos reféns de nós mesmos? O inconsciente, esse vasto oceano que abriga traumas, medos, desejos ocultos e arquétipos ancestrais, nos comanda silenciosamente enquanto acreditamos estar no controle. O que chamamos de azar ou sorte muitas vezes é apenas a manifestação de batalhas internas que nunca ousamos enfrentar.
As 42 Leis de MA’AT, a base ética e espiritual do Egito Antigo, não eram meros códigos morais; eram lembretes diários de que o equilíbrio externo nasce do alinhamento interno. “Eu não causei sofrimento deliberadamente”, “Eu não vivi na falsidade”, “Eu respeitei a sacralidade de todas as coisas” — cada uma dessas leis nos obriga a refletir sobre o quanto estamos conscientes de nossos atos, pensamentos e intenções. MA’AT nos ensina que viver em verdade não é apenas um compromisso com o mundo, mas sobretudo um pacto conosco mesmos. E, como descobri com o tempo, a verdade não é um ponto fixo; ela se revela conforme nos dispomos a mergulhar nas profundezas do nosso ser.
Há um provérbio africano que sempre me impactou: “Aquele que conhece os outros é sábio, aquele que conhece a si mesmo é iluminado.” O autoconhecimento, tão romantizado hoje, é na verdade uma jornada crua, dolorosa, mas transformadora. E os povos indígenas, guardiões de uma sabedoria que o mundo moderno insiste em ignorar, nos lembram: “ A pessoa que silencia sua mente, ouve o universo.” A introspecção não é uma fuga da realidade, mas um retorno ao que sempre fomos antes de sermos moldados pelo mundo. Quantas vezes me peguei perdido em meio às demandas externas, apenas para perceber que o verdadeiro labirinto estava dentro de mim?
A meditação, essa prática milenar que atravessa continentes e culturas, tornou-se minha bússola. Quando fecho os olhos e me permito ouvir o silêncio, percebo o caos interno que tento ignorar no cotidiano. Jung já apontava que o confronto com a sombra — tudo aquilo que reprimimos ou negamos em nós mesmos — era essencial para a individuação, o processo de nos tornarmos inteiros. E como disse Rumi, “A ferida é o lugar por onde a luz entra em você.” É nesse silêncio, muitas vezes incômodo, que nos deparamos com nossas feridas, mas também com nossa luz.
Nietzsche, sempre provocador, afirmou: “Torne-se quem você é.” Mas como se tornar algo que desconhecemos? É aqui que compreendo o valor do questionamento contínuo. Os estoicos, como Marco Aurélio, insistiam que o domínio de si mesmo era o ápice da liberdade. “Você tem poder sobre sua mente, não sobre eventos externos. Perceba isso e encontrará a força.” A liberdade verdadeira não está em escapar das circunstâncias, mas em compreender que a maior prisão é a inconsciência.
A jornada para o autoconhecimento não é linear. Há dias em que sinto que avancei milhas; outros, me vejo preso nos mesmos ciclos. Mas sei que cada momento de introspecção, cada meditação, cada questionamento me aproxima de uma versão mais consciente de mim mesmo. E, como ensina um provérbio africano: “Se você não sabe para onde está indo, qualquer caminho serve.” Tornar-se consciente é, antes de tudo, escolher o caminho com clareza, sabendo que ele é moldado por cada pensamento, cada medo enfrentado, cada sombra iluminada.
Enquanto permanecermos alheios ao que nos move internamente, continuaremos chamando de destino aquilo que, na verdade, é apenas o reflexo de nossa inconsciência. Mas há sempre uma escolha. E ela começa quando olhamos para dentro, silenciosamente, e perguntamos: “Quem sou eu?” A resposta não virá de imediato, nem será única. Mas, como os sábios ancestrais sempre souberam, o simples ato de perguntar já é o primeiro passo para a liberdade.