A internet está cheia de gurus. Mas quem está ouvindo seu próprio corpo?

O mundo está saturado. Saturado de discursos, de certezas embaladas, de promessas fabricadas em escala industrial. E, curiosamente, quanto mais se fala, menos se ouve. Vivemos uma hiperinflação de vozes externas e uma falência coletiva da escuta interna.

Especialmente aqui, nestas terras profanadas e rebatizadas de Brasil — que antes se chamavam Pindorama, terra das palmeiras e dos povos livres — o excesso não é apenas informacional, é estrutural. É sintoma de um projeto profundo de colonização da alma.

Andamos por entre algoritmos como se fossem oráculos. Seguimos perfis como se fossem profetas. Adotamos planos de sete passos, dez mandamentos e trinta dias de milagre — esperando que algo fora de nós nos salve. A verdade, no entanto, permanece onde sempre esteve: no corpo.

Mas poucos escutam. E menos ainda compreendem o que significa escutar com o corpo.

NPCs, políticos de estimação e a alienação da consciência corporal

Vivemos cercados por NPCs existenciais: personagens programados, operando sem presença, repetindo mantras de idolatria política e tribalismo ideológico. “Meu político é melhor porque fez isso.” “O seu é pior porque fez aquilo.” Nenhum pensa: todos reagem. E essa reação é exatamente o que o sistema deseja: um povo emocionalmente agitado, mentalmente condicionado, biologicamente intoxicado.

Enquanto discutem apaixonadamente sobre figuras políticas que jamais os notarão, poucos percebem que seus próprios corpos estão pedindo socorro em silêncio. Que sua pele, seu intestino, sua ansiedade e seu sono são mensagens. E que ignorar isso é um ato de traição contra si mesmo.

Mais grave ainda: ao tentar escapar da alienação, muitos caem nas mãos de novos opressores — os gurus contemporâneos, mestres de ilusão digital, que vendem milagres em cápsulas, espiritualidade em stories e felicidade em pacotes promocionais.

Ciência é ancestralidade: o corpo como linguagem energética

Antes da modernidade dar nome à “ciência”, ela já existia como prática viva nos templos africanos. A ciência não nasceu na Europa: ela foi sequestrada lá.

Antes de Hipócrates, havia Imhotep — médico, arquiteto, astrônomo e sacerdote egípcio, cuja medicina integrava espírito, natureza e corpo em um único saber. Ele tratava doenças com jejum, silêncio, ervas e observação. Ele escutava o corpo.

Em 1931, Otto Heinrich Warburg, médico alemão, recebeu o Prêmio Nobel ao provar que nenhuma doença sobrevive em ambientes oxigenados e alcalinos. Ele demonstrou que células cancerígenas se desenvolvem em meios ácidos e anaeróbicos — e que o terreno celular importa mais que o agente externo.

É a qualidade do seu corpo que define sua força vital.

É a vitalidade interna que determina se a doença encontra morada.

Essa não é uma afirmação esotérica. É ciência. Mas também é ancestralidade. Porque os nossos sabiam disso. Sempre souberam.

Comer com escuta. Respirar com intenção. Viver com discernimento.

A sabedoria silenciosa do corpo não se impõe — ela sussurra. Mas o problema é que vivemos em ruído constante.

Nos alimentamos em frente à TV. Respiramos de forma curta e automática. Dormimos com telas, acordamos com notificações. E ainda esperamos encontrar equilíbrio dentro desse caos. É ingenuidade ou desespero?

Comer deixou de ser um rito para se tornar um reflexo. Engolimos qualquer coisa, a qualquer hora, em qualquer lugar. Nos esquecemos de que a boca é o início do templo.

Aquilo que colocamos nela não é só alimento. É crença. É cultura. É energia.

Cada refeição é um pacto. Ou com a vitalidade, ou com a entropia.

E não se trata aqui de pregar vegetarianismo, jejum ou minimalismo nutricional. Trata-se de escuta. O corpo fala. Sempre falou. Você é que foi ensinado a ignorar.

O colapso do discernimento e a epidemia de fórmulas

Num mundo em que todo mundo tem uma fórmula mágica, confiar em si tornou-se um ato radical.

Não por acaso, a maior indústria do planeta não é a bélica, nem a alimentícia — é a indústria da promessa.

A promessa de que você vai ser melhor, mais bonito, mais rico, mais espiritualizado, mais forte, mais magro, mais qualquer coisa. Desde que compre o curso certo. Siga o perfil certo. Adote o método certo.

Mas o método mais honesto é aquele que vem do seu corpo.

Você não precisa de uma nova rotina milagrosa. Precisa de silêncio. De presença. De um copo d’água bebido com atenção. De um prato com cor e vida. De um sono profundo. De menos comparação e mais respiração.

E isso não vende. Por isso, não viraliza.

O corpo como último oráculo

O corpo é o último oráculo não silenciado. Ele não mente. Ele não adula. Ele não negocia.

Mas para acessá-lo, é preciso desaprender tudo que te ensinaram sobre saúde.

É preciso sair do controle do guru e entrar na soberania do sentir.

É preciso respeitar a dor como mensageira.

O cansaço como sinal.

A inflamação como fronteira.

A fome real como sabedoria.

E a leveza como bússola.

O corpo guarda segredos que nenhuma mentoria revela. Ele sabe, porque ele é.

Escolher escutar o corpo é rebelar-se contra o sistema

Você não vai ver isso em propaganda.

Não vai ser aclamado por isso.

Talvez até seja ridicularizado.

Mas no fundo, todos sabem:

Quem se escuta, se cura.

Quem se cura, ameaça o sistema.

Quem escuta o corpo, silencia o ruído.

E nesse silêncio, habita o sagrado.

Frase de encerramento:

“A sabedoria que você procura nos gurus da internet está escondida no lugar mais óbvio e mais negligenciado: dentro do seu próprio corpo.”

 

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch é escritor, dancarino, produtor de conteúdo digital desde 2015, formado em Letras pela Faculdade Capixaba do Espírito Santo (Multivix 2011-2014) e pós-graduado pela Faculdade União Cultural do estado de São Paulo (2015-2016).
Vasta experiência internacional, já morou em Dublin(Irlanda), Portugal, é um espírito livre, já visitou mais de 15 países da Europa e atualmente mora em São Paulo.
É coautor no livro: Versões do Perdão, autor do livro O Diário de Ayron e também de Breves Reflexões para não Desistir da Vida.

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