A história contada pelos opressores sempre buscou reduzir a luta do povo preto a uma narrativa de submissão e sofrimento. Mas a realidade é que a resistência sempre foi a espinha dorsal da nossa existência. Django Livre pode ter trazido ao cinema uma versão estilizada da revolta, mas homens como Dangerfield Newby, John Brown e Nat Turner foram o verdadeiro pesadelo dos escravocratas. Eles não pediram liberdade, eles a tomaram, a sangue, suor e estratégia.
Dangerfield Newby não aceitou o destino imposto. Sua esposa e filhos estavam condenados ao cativeiro, e ele sabia que esperar misericórdia dos colonizadores era tão inútil quanto tentar negociar com uma fera faminta. Ele se uniu ao grupo de John Brown não por ideais vazios, mas por amor, por vingança, por justiça. Newby morreu lutando, mas não sem antes deixar claro que um homem livre jamais se curvaria sem resistência.
John Brown, um abolicionista que não acreditava no diálogo com os carrascos, foi além das palavras. Empunhou o facão e fez valer a única linguagem que os escravocratas compreendiam: a do medo. Ele sabia que não se destrói um sistema violento com súplicas. E foi assim que, ao lado de seus aliados, se tornou uma sombra ameaçadora sobre aqueles que lucravam com a exploração de corpos alheios.
Nat Turner, por sua vez, compreendeu que sua missão não era apenas fugir, mas incendiar. Sua revolta foi um terremoto que sacudiu a Virgínia, desafiando um império de brutalidade e provando que aqueles a quem chamavam de propriedade tinham dentro de si a chama da insubmissão. Eles diziam que eram senhores de outros seres humanos, mas tremeram diante da fúria de Turner. Ele foi assassinado, mas sua mensagem jamais se calou.
A resistência não morreu no século XIX. O mesmo sistema que tentava manter nosso povo no cativeiro físico, hoje se reinventa em outras prisões: a desigualdade, o encarceramento em massa, a desvalorização de nossas histórias. Mas a verdade, como um provérbio africano nos ensina, é que “enquanto o leão não contar sua história, a caça sempre será glorificada.” Chegou o momento de reescrever os fatos, de recuperar o legado de luta que tentaram apagar.

Hoje, quando falamos de Newby, Brown e Turner, não estamos apenas revivendo o passado — estamos reconhecendo um chamado que atravessa o tempo até nós. Eles foram caçados e mortos, mas seus nomes não se apagaram. Suas ações nos lembram que o opressor nunca recua por vontade própria. Tudo o que conquistamos, de lá para cá, foi arrancado, não concedido.
Nossa luta não é apenas lembrar, mas agir. A história não se repete, mas os padrões da opressão permanecem, se não forem destruídos. Não basta conhecer o terror que esses homens provocaram nos escravocratas. Precisamos compreender que esse mesmo espírito de insubmissão, de resistência, de justiça, ainda vive em nós.
A história do povo preto não começa na escravidão, você já sabe disso. Pois bem, é impossível ignorar o peso desse capítulo e as revoltas que moldaram a luta pela liberdade. Ao longo dos séculos, houve resistência em diversas formas — e é exatamente isso que The Good Lord Bird (2020) e The Birth of a Nation (2016) retratam. São obras essenciais para quem deseja compreender melhor as figuras históricas que desafiaram o sistema escravocrata nos Estados Unidos.
The Good Lord Bird (2020) – A insurreição de John Brown

Essa série, estrelada por Ethan Hawke, mergulha na trajetória de John Brown, o abolicionista branco que não acreditava em diálogo com escravocratas e optou pelo confronto direto. Diferente de muitos que tentaram acordos políticos, Brown pegou em armas, organizou rebeliões e se tornou o pesadelo dos senhores de escravizados. Sua aliança com figuras como Dangerfield Newby, um homem preto que lutava para libertar sua esposa e filhos do cativeiro, tornou sua causa ainda mais impactante.
A série traz um equilíbrio entre drama e ironia, expondo o absurdo da escravidão e os contrastes entre aqueles que lutavam pela justiça e os que insistiam em defender um sistema desumano. A atuação de Ethan Hawke como John Brown é visceral, e o roteiro mistura humor ácido e ação para nos lembrar que a liberdade nunca foi concedida — sempre foi arrancada à força.
Se você quer conhecer a história real por trás de Django Livre, The Good Lord Bird é um complemento necessário. Não se trata apenas de entretenimento, mas de uma reconstrução histórica poderosa que nos faz refletir sobre o papel da insubmissão na luta preta.
The Birth of a Nation (2016) – A revolta de Nat Turner

Se The Good Lord Bird mostra a fúria dos aliados brancos na causa abolicionista, The Birth of a Nation foca na força interna do próprio povo escravizado. O filme, dirigido e estrelado por Nate Parker, narra a história de Nat Turner, um homem preto que, a princípio, foi usado pelos senhores como pregador para manter seus irmãos subjugados. Mas o conhecimento é um veneno para o sistema, e Turner logo percebeu que sua missão não era apaziguar — era incendiar.
Ele liderou uma das maiores revoltas de escravizados da história dos EUA, eliminando senhores e espalhando terror entre os opressores. O filme não romantiza a luta: ele mostra o preço da resistência e as brutalidades que se seguiram. É um filme forte, desconfortável, mas necessário.
O nome The Birth of a Nation foi escolhido para reverter o significado do infame filme racista de 1915, que glorificava a KKK. Nate Parker ressignificou o título para mostrar que a verdadeira nação americana nasceu não da supremacia branca, mas da luta dos povos que resistiram à opressão.
Por que esses filmes são indispensáveis?
A narrativa histórica sempre tentou apagar ou suavizar a resistência preta, vendendo a ideia de que a abolição foi uma dádiva dos brancos iluminados. Mas a verdade é outra: a escravidão foi combatida com sangue, inteligência e coragem. Homens como John Brown e Nat Turner não esperaram libertação — eles a impuseram.
Esses dois filmes são um convite para enxergar a luta preta como ela realmente foi: ativa, feroz, revolucionária. Se você quer ampliar sua visão sobre a história, The Good Lord Bird e The Birth of a Nation precisam estar na sua lista. Porque entender o passado é essencial para moldar o futuro.