A vida é um jogo mental — e vencer exige mais do que apenas força, exige domínio da própria mente. Ao contemplar a imagem desse jovem lutador, vejo refletida minha própria infância no interior da Bahia, um período marcado por desafios que pareciam insuperáveis. Cresci em um contexto perturbador, sem afeto familiar, sem perspectivas de mudança. O peso de uma história coletiva me acompanhava: a realidade de milhares de famílias pretas, herdeiras de povos africanos sequestrados, trazidos à força para o Brasil, condenados à desumanização durante a escravidão e à negligência após 1888. A abolição nunca trouxe reparação. Os grilhões físicos se desfizeram, mas os grilhões mentais persistiram, alimentados por um sistema que nunca quis nos ver livres.
Ainda assim, em meio ao caos, uma chama foi acesa. Duda, uma vizinha que cruzou meu caminho, pegou minha mão e me levou à escola quando meus próprios pais não se importaram em fazê-lo. Seus motivos? Os mesmos que atravessam gerações de famílias pretas: sobrevivência, cansaço, um sistema que nos empurra para a margem. Mas Duda viu além. Seu gesto simples transformou tudo. Ela me olhou nos olhos e disse: “Nunca se desvie do conhecimento, nunca saia do caminho da educação. Seu futuro é brilhante. Você vai ajudar muitas pessoas com sua sabedoria e talento.”
Eu tinha sete anos. Suas palavras se tornaram um mantra que me acompanha até hoje: meu futuro é brilhante. Repeti isso todos os dias, mesmo quando a vida gritava o contrário. Repeti quando a fome apertava, quando a solidão sufocava, quando o mundo me dizia que eu não era suficiente. E aqui estou, não porque o destino me favoreceu, mas porque aprendi que a mente é o verdadeiro campo de batalha.
A imagem deste menino, com o olhar feroz e o corpo pronto para a luta, me lembra que o combate mais difícil não é contra o mundo externo, mas contra as crenças que tentam nos limitar. Minha mente não é minha inimiga. É minha maior aliada. Foi ela que me fez romper os muros invisíveis que o racismo constrói. Foi ela que me fez entender que, apesar de toda a opressão, carrego dentro de mim a força de reis, rainhas, guerreiros e griôs africanos. Sou herdeiro de uma história de glória, genialidade, poder, impacto, e muita resistência e inúmeros desafios. Estou acordado! Estou jogando o jogo com minhas cartas na manga. Não estou sozinho. Nunca estive, ninguém está.
Controlar a mente é ter o poder de moldar a própria realidade. Não há trono mais alto do que aquele construído dentro de nós. O menino da imagem sabe disso, ainda que inconscientemente. Seu olhar diz: estou aqui, e não vou recuar. Assim como eu, ele sabe que a vida testará sua coragem, mas que a vitória pertence àqueles que não se curvam. Eu nunca me curvei. E nunca me curvarei.
Talvez, como Duda fez por mim, minhas palavras alcancem alguém hoje. Talvez alguém, em algum lugar, esteja precisando ouvir que o caminho da educação, do conhecimento e do autodomínio é o caminho para a liberdade. Porque a verdadeira libertação começa dentro da mente. Meu futuro é brilhante — e o seu também pode ser.