E mais uma vez, temos aqui os dados alarmantes de um dos mais importantes relatórios do Brasil quando o assunto é violência policial contra corpos pretos. Pois bem, o relatório Pele Alvo, da Rede de Observatórios da Segurança, escancara uma realidade cruel: em 2023, a cada quatro horas, uma pessoa preta foi morta pela polícia. Este cenário devastador persiste há cinco anos, reforçando a urgência de mudanças profundas no sistema de segurança pública.
O relatório, publicado desde 2019, analisa dados de nove estados: Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo. Em 2023, as polícias desses estados foram responsáveis por 4.025 mortes. Dentre os casos com identificação de raça, 87,8% das vítimas eram pretas ou pardas – um número que não pode ser ignorado. Essa violência atinge principalmente jovens entre 18 e 29 anos, colocando em evidência o genocídio da juventude preta.
Um Genocídio Silenciado
A letalidade policial não é apenas uma questão de números; é a materialização do racismo estrutural que permeia as instituições brasileiras. A cor da pele continua sendo um fator determinante entre quem vive e quem morre sob a mira do Estado. A juventude preta, em particular, carrega o peso dessa violência, sendo sistematicamente caçada em territórios marginalizados.
O relatório destaca que, em estados como o Rio de Janeiro, os dados de idade começaram a ser mais detalhados, reduzindo a categoria de “não informados” e revelando que 40,4% das vítimas identificadas têm entre 18 e 29 anos. Essa maior transparência joga luz sobre o alvo preferencial das políticas de extermínio: jovens negros.
Contrastes Entre Estados: Reduções e Aumentos
Embora o Rio de Janeiro tenha registrado uma redução de 34,5% na letalidade policial – encerrando o ano com 871 mortes, o menor número em anos –, o panorama geral ainda é de extrema preocupação. Medidas como a ADPF 635 e a pressão do governo federal ajudaram a conter, temporariamente, o massacre, mas a estrutura permanece intacta.
São Paulo, por sua vez, seguiu na contramão. Com um aumento de 21,7% nas mortes provocadas pela polícia, o estado voltou a adotar políticas mais agressivas sob o governo de Tarcísio de Freitas, como o desinvestimento em câmeras corporais. Essas mudanças resultaram em mais vidas perdidas e aprofundaram a desconfiança nas forças de segurança.
Enquanto isso, estados como Amazonas e Maranhão apresentaram quedas expressivas, com reduções de 40,4% e 32,6%, respectivamente. No entanto, essas quedas pontuais não mudam o fato de que a violência policial continua sendo um problema sistêmico e racializado em todo o país.
Racismo de Estado
Os dados do relatório Pele Alvo confirmam o que movimentos negros e ativistas vêm denunciando há décadas: o Brasil vive um racismo de Estado, onde a polícia atua como agente de extermínio da população preta. Não há neutralidade nos gatilhos policiais; há corpos específicos sendo escolhidos para morrer.
É preciso questionar: até quando as políticas de segurança pública continuarão legitimando a violência como ferramenta de controle social? Até quando o Estado brasileiro será cúmplice do genocídio da sua própria população?
O relatório mais uma vez cumpre o papel de denunciar, mas cabe à sociedade e às autoridades romperem o ciclo de violência e racismo. Porque vidas pretas importam – e a luta por justiça e equidade não pode esperar.