Vivemos o fenômeno da economia da atenção, e, pelo que tudo indica, muitos setores da esquerda no Brasil parecem não ter despertado para a revolução das redes, especialmente no que tange à inteligência artificial (IA). Isso se torna ainda mais claro com a ascensão de candidatos como Pablo Marçal, conhecido por muitos como “Coach”, que tem utilizado as redes sociais com uma maestria impressionante, consolidando sua presença e influência no cenário eleitoral.
A mais recente pesquisa Quaest, divulgada em 11 de setembro, revelou um cenário preocupante para a esquerda na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Pela primeira vez desde a redemocratização, há um risco real de que nenhum candidato de esquerda avance para o segundo turno. Com exceção de 2016, quando João Doria venceu no primeiro turno, a esquerda sempre conseguiu chegar à fase decisiva da eleição paulistana. Contudo, desta vez, a combinação da força das redes sociais e da alta exposição midiática dos concorrentes ameaça esse histórico.
O atual prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o influenciador digital Pablo Marçal (PRTB) estão tecnicamente empatados com o candidato do PSOL, Guilherme Boulos, mas os números absolutos mostram que ambos ultrapassaram Boulos. Nunes, que tem dominado o tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV — controlando mais de seis minutos dos 10 totais —, tem mostrado crescimento constante. Seu uso da mídia tradicional tem sido um fator determinante, consolidando seu favoritismo entre eleitores mais conservadores e de classe média.
Por outro lado, Marçal, sem os mesmos recursos televisivos, tem conseguido atingir eleitores de maneira eficaz através de sua capilaridade nas redes sociais. Ele domina o cenário digital com uma abordagem direta e voltada ao entretenimento, utilizando algoritmos e IA para maximizar o engajamento. Na pesquisa espontânea da Quaest, Marçal apareceu liderando pela primeira vez, o que indica o sucesso de sua estratégia digital.
Essa ascensão de Marçal e o crescimento de Nunes apontam para uma deficiência da esquerda em captar as mudanças tecnológicas e midiáticas que moldam as campanhas eleitorais contemporâneas. A esquerda, tradicionalmente ligada a movimentos sociais e políticas de base, parece ter ficado para trás na disputa pela atenção dos eleitores em um mundo onde a comunicação digital, as redes sociais e a economia da atenção ditam as regras.
O caso de Pablo Marçal é emblemático. Com uma comunicação voltada ao público jovem e empreendedor, ele transforma sua presença nas redes em uma plataforma de amplificação de suas ideias. Utilizando uma retórica de superação pessoal e sucesso individual, Marçal fala diretamente com o eleitorado que se sente desiludido com a política tradicional e com as soluções oferecidas pela esquerda. Ele personifica a nova dinâmica eleitoral, na qual ser “coach” e “influenciador” pode valer mais do que tempo de TV.
Enquanto isso, candidatos como Boulos, apesar de sua popularidade e carisma, parecem estar lutando para se adaptar totalmente a essa nova realidade digital. A esquerda precisa repensar suas estratégias de comunicação se quiser se manter competitiva em um ambiente onde a IA e a economia da atenção se tornaram ferramentas centrais para o sucesso eleitoral. A simples presença nas redes já não basta; é preciso compreender e dominar as novas tecnologias e as formas como elas impactam o comportamento do eleitor.
A campanha eleitoral de 2024 em São Paulo não é apenas uma disputa política tradicional. Ela é um reflexo de uma batalha maior pela atenção do público, onde a habilidade de se destacar nas plataformas digitais pode ser a diferença entre vitória e derrota. Se a esquerda não acordar para essa nova realidade, corre o risco de ficar fora do segundo turno e perder a oportunidade de influenciar os rumos de uma das maiores cidades do país.
Wanderson Dutch.