Ditadura Trump assina ordem para deportar universitários estrangeiros pró-Palestina.

O que diferencia um regime autoritário de uma democracia? A liberdade de expressão, o direito à dissidência e a segurança de que nenhum governo pode silenciar seus opositores sem sofrer resistência. Mas, na realidade política dos Estados Unidos sob Donald Trump, essas fronteiras se tornam cada vez mais borradas. A nova ordem executiva que autoriza a deportação de estudantes estrangeiros que participam de manifestações pró-Palestina é mais um passo rumo ao que podemos chamar de uma ditadura contemporânea socialmente aceita – uma repressão velada, respaldada pela narrativa do “combate ao extremismo”, e que encontra apoio popular entre aqueles que, conscientemente ou não, normalizam a supressão de direitos fundamentais.

O pretexto do governo Trump para justificar essa medida é o suposto combate ao antissemitismo e ao radicalismo islâmico nas universidades. No entanto, a realidade é muito mais sombria: trata-se de uma estratégia deliberada para silenciar qualquer resistência ao apoio incondicional dos EUA a Israel. Ao vincular protestos pró-Palestina a “jihadismo” e “terrorismo”, Trump não apenas criminaliza a solidariedade internacional com os palestinos, mas também reforça uma narrativa islamofóbica e racista, onde qualquer manifestação de apoio a um povo massacrado é imediatamente enquadrada como ameaça à segurança nacional.

A perseguição ideológica travestida de lei

O conceito de liberdade acadêmica, fundamental para qualquer democracia, está sendo sistematicamente corroído. Universidades, historicamente espaços de debate e contestação, são agora alvo direto de uma política de vigilância e repressão. A ordem executiva não apenas expulsa estudantes estrangeiros sob um critério político arbitrário, mas também envia um recado claro a toda a comunidade acadêmica: se você se opõe à política externa dos EUA, será silenciado.

Isso estabelece um precedente perigoso. Se hoje são os estudantes estrangeiros que sofrem represálias, amanhã qualquer pessoa que questione os interesses do governo pode ser perseguida sob justificativas igualmente frágeis. Quem decide quais manifestações são aceitáveis? Quem garante que essa política não se expanda para incluir cidadãos norte-americanos que se envolvem em causas consideradas “inconvenientes” pelo governo? Esse é o princípio básico de regimes autoritários: primeiro se persegue um grupo marginalizado, depois a repressão se amplia, engolindo qualquer um que ousa pensar diferente.

A hipocrisia dessa medida fica evidente quando comparamos a resposta do governo Trump a diferentes tipos de protesto. Enquanto manifestações a favor da Palestina são criminalizadas, discursos supremacistas brancos e protestos armados de grupos neonazistas continuam sendo protegidos sob o manto da liberdade de expressão. O próprio governo, que agora se diz preocupado com o “radicalismo” nas universidades, já mostrou inúmeras vezes sua complacência com discursos violentos e intolerantes quando estes vêm da extrema direita.

Demônios da nossa contemporaneadade

Israel, Palestina e a aliança inquestionável

A repressão aos estudantes pró-Palestina não pode ser dissociada do alinhamento absoluto dos Estados Unidos com Israel. Desde o início do conflito entre Israel e Palestina, os EUA sempre se posicionaram como um aliado incondicional do governo israelense, fornecendo financiamento militar, apoio diplomático e blindagem política para as ações do Estado de Israel, mesmo diante de acusações de crimes de guerra e genocídio.

A tentativa de silenciar manifestações pró-Palestina nas universidades não é apenas um reflexo desse alinhamento político, mas também um esforço para impedir que uma nova geração de ativistas e acadêmicos questione a hegemonia do discurso pró-Israel nos Estados Unidos. Ao deportar estudantes estrangeiros por participarem de protestos contra a ocupação e o massacre em Gaza, Trump e seus aliados estão, na prática, suprimindo qualquer possibilidade de um debate público honesto sobre o papel dos EUA nesse conflito.

A medida não visa apenas controlar os campi universitários, mas moldar a opinião pública para que apenas um lado da história seja contado. Trata-se de uma estratégia de coerção e medo, onde o custo de falar sobre Palestina pode ser a perda do direito de permanecer no país.

Uma escalada autoritária que não pode ser ignorada

O que estamos testemunhando é um perigoso desvio do ideal democrático que os Estados Unidos dizem defender. Ao transformar a dissidência política em um crime passível de deportação, Trump cria um ambiente de censura e repressão, onde a crítica ao governo se torna um risco pessoal e institucional.

Se essa ordem executiva não for contestada, ela abrirá espaço para uma repressão ainda mais ampla. A máquina estatal, agora voltada para perseguir estudantes estrangeiros que se manifestam, pode facilmente ser usada para reprimir qualquer forma de resistência – seja contra a política externa dos EUA, contra o racismo estrutural ou contra o próprio governo Trump.

Este é o verdadeiro rosto da ditadura contemporânea: um regime que, sob o pretexto da segurança nacional, redefine os limites da liberdade para garantir que apenas certas vozes sejam ouvidas. Se essa escalada não for barrada, o que virá depois? A criminalização total dos movimentos sociais? A expulsão de professores e pesquisadores que se posicionam contra o sistema? A repressão de jornalistas que denunciam as atrocidades cometidas por aliados estratégicos dos EUA?

A história nos ensina que regimes autoritários não nascem do dia para a noite. Eles se constroem lentamente, peça por peça, justificativa por justificativa, até que a repressão se torne norma e a resistência seja vista como crime. A decisão de Trump de deportar estudantes pró-Palestina é um passo significativo nessa direção – e ignorá-lo é permitir que o autoritarismo se normalize, até que seja tarde demais para reagir.

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch é escritor, dancarino, produtor de conteúdo digital desde 2015, formado em Letras pela Faculdade Capixaba do Espírito Santo (Multivix 2011-2014) e pós-graduado pela Faculdade União Cultural do estado de São Paulo (2015-2016).
Vasta experiência internacional, já morou em Dublin(Irlanda), Portugal, é um espírito livre, já visitou mais de 15 países da Europa e atualmente mora em São Paulo.
É coautor no livro: Versões do Perdão, autor do livro O Diário de Ayron e também de Breves Reflexões para não Desistir da Vida.

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