Eu compreendo que não é possível ignorar completamente as engrenagens do mundo. Estamos inseridos no holograma da realidade consensual, e isso significa que há coisas que precisam ser feitas: você precisa acordar, levantar, pagar boletos quando necessário, treinar o corpo na academia, alimentar-se bem, trabalhar, transar, criar, cuidar de si. Tudo isso faz parte da experiência material, e fingir que essas obrigações não existem seria ingenuidade.
Mas o convite para abandonar as contradições e incoerências do mundo não é um chamado para negligenciar a vida prática. É um chamado para direcionar sua atenção para aquilo que realmente importa. Porque a maioria das pessoas vive aprisionada em ciclos de pensamento que apenas perpetuam confusão, dispersão e sofrimento. Enquanto sua mente está consumida pelo caos externo, pela indignação, pelas ilusões da coletividade, você esquece do essencial: seu estado interno define a sua realidade.
Esse pensamento surgiu em um momento de silêncio, em uma meditação. Após atingir um estado de neutralidade, fiz uma pergunta simples ao meu Superconsciente—a versão mais elevada da minha própria inteligência: qual deveria ser a próxima matéria? E a resposta veio de forma sutil e precisa: escreva sobre abandonar as contradições do mundo.
Esse é o poder da introspecção. Quando a mente se aquieta, a verdade aparece. Porque enquanto estamos absorvidos pelo ruído externo, pelas guerras de narrativas, pelos conflitos emocionais que não são nossos, nos tornamos marionetes de um sistema projetado para nos manter em permanente contradição. Mas há uma saída.
O jogo das contradições: como o mundo aprisiona sua mente
Se observarmos atentamente, perceberemos que o mundo opera em um teatro de incoerências programadas. Dizem que vivemos em sociedades livres, mas a maioria das pessoas está acorrentada a rotinas exaustivas, crenças limitantes e um sistema econômico que premia a escassez. Pregamos paz, mas normalizamos a violência estrutural em diversas formas. Buscamos felicidade, mas estamos mergulhados em distrações que apenas ampliam o vazio interno. Sim, deram o nome pra isso de capitalismo.
Antes mesmo de o termo “capitalismo” ser cunhado, o mundo já operava sob dinâmicas de poder, organização social e conflitos de interesse. Mas isso significa que a competição e a luta de classes sempre foram o eixo central da existência humana? A resposta não é tão simples.
Depende da lente pela qual você escolhe interpretar a realidade. Se adotarmos uma perspectiva marxista ortodoxa, a história da humanidade é, acima de tudo, uma história de luta de classes. A exploração do trabalho, a disputa por recursos e a opressão de um grupo sobre o outro seriam os motores inevitáveis do desenvolvimento social. Mas essa é, no máximo, uma meia verdade—um recorte que ignora a multiplicidade de sistemas de organização humana ao longo dos milênios.
Nossa estrutura social não começou há dois mil anos, tampouco pode ser reduzida a uma linearidade europeia. Antes da imposição colonial, antes da ascensão dos impérios comerciais, antes do modelo de exploração sistemática, existiam sociedades que não se organizavam sob o paradigma da exploração econômica desenfreada. Civilizações africanas, indígenas, asiáticas e de outras partes do mundo possuíam seus próprios modos de sobrevivência e desenvolvimento, muitas vezes fundamentados em princípios de reciprocidade, equilíbrio ecológico e estruturas sociais que não reproduziam o modelo binário de opressores e oprimidos.
Isso não significa que todas as sociedades antigas eram utópicas, livres de conflitos ou hierarquias. Mas significa que a visão de que o mundo sempre operou sob as mesmas dinâmicas de dominação materialista é uma narrativa construída a partir de um olhar ocidental e moderno. A história não pode ser reduzida a um ciclo único de opressão econômica, porque a humanidade já existiu de maneiras que não se encaixam nos conceitos europeus de classe, propriedade privada e acumulação.
Assim, quando perguntamos se o mundo sempre viveu sob luta de classes e competição, estamos, na verdade, projetando um conceito moderno sobre realidades que funcionavam sob outras lógicas. O erro não está apenas na resposta, mas na própria pergunta.
Essa dicotomia não é acidental. O filósofo Guy Debord, em A Sociedade do Espetáculo, explica como vivemos em um mundo onde as imagens e narrativas são manipuladas para criar distração e alienação. O foco não está na realidade, mas naquilo que é apresentado como realidade. O resultado? Um exército de pessoas confusas, reativas e emocionalmente instáveis, sem clareza sobre o que realmente importa.
A saída desse labirinto começa com uma decisão: retomar o controle da própria mente e abandonar o jogo das contradições.
A chave: práticas diárias para transcender o caos
A boa notícia é que não é necessário abandonar a vida material para encontrar paz interior e clareza. O segredo está em cultivar um estado de presença e coerência interna, mesmo enquanto participa do mundo.
Aqui estão algumas práticas para sair do campo das incoerências e acessar uma realidade mais alinhada:
• Meditação diária: desacelerar os pensamentos é a única forma de enxergar o que é real e o que é ruído. A resposta que recebi do Superconsciente veio porque havia espaço mental para recebê-la. O mesmo pode acontecer com você.
• Alinhamento entre discurso e prática: observe se você está falando uma coisa e vivendo outra. Se diz que valoriza saúde, mas não cuida do corpo, há uma contradição. Se busca paz, mas alimenta conflitos internos, algo precisa ser ajustado.
• Seleção de informações: todos os dias, você escolhe o que consome. Você pode alimentar sua mente com sabedoria ou com o caos das redes sociais e notícias tóxicas. Faça essa escolha de forma consciente.
• Respiração consciente: práticas como Pranayama ou apenas respirar profundamente por alguns minutos ajudam a reprogramar sua frequência interna, reduzindo a reatividade ao caos externo.
• Ritual da primeira hora do dia: como você começa a manhã determina sua vibração. Se acorda e já se perde em distrações, entra no dia carregando ruído mental. Mas se inicia com silêncio, leitura, movimento e gratidão, constrói uma base sólida.
Abandonar as contradições é um ato de libertação
O mundo continuará tentando te puxar para suas incoerências. Políticos continuarão mentindo. As instituições continuarão contraditórias. As pessoas ao seu redor seguirão presas a padrões limitantes. Mas você não precisa jogar esse jogo.
Você pode simplesmente observar o caos sem se deixar levar por ele. Você pode existir no mundo sem se tornar vítima da sua programação. E, principalmente, pode viver em plena coerência, dentro e fora, sem ser arrastado por narrativas externas.
Porque, no fim, as contradições não pertencem a você. São apenas parte do espetáculo. E você tem o direito de sair do palco.