O Pan-Africanismo surge como uma visão essencial que busca unir os povos de ascendência africana, impulsionado pela percepção de interesses comuns. Historicamente, essa ideologia tem se manifestado principalmente como um movimento de caráter político ou cultural, embora suas diversas facetas revelem nuances e desafios profundos. Em sua vertente política mais específica, os pan-africanistas propõem a construção de uma nação africana unificada, um ideal que, no entanto, deve ser examinado criticamente.
A diáspora africana, fruto de um prolongado processo histórico, destaca-se como um elemento central na compreensão do Pan-Africanismo. A dispersão forçada de pessoas de ascendência africana de suas terras ancestrais para várias partes do mundo ecoa as marcas de uma história marcada por injustiças, exploração e desigualdades sistêmicas.
Em uma perspectiva mais ampla, o Pan-Africanismo não apenas reconhece, mas confronta a urgência de abordar as questões que unem as pessoas de ascendência africana. Essa união não deve ser apenas celebrada, mas também instiga um chamado à ação contra os desafios sistêmicos, raciais e sociais que persistem. Assim, o Pan-Africanismo não é apenas uma ideia, mas um apelo para toda população negra para lutar por transformação, justiça e emancipação de uma comunidade global que compartilha uma história interligada.
Historia dos intelectuais Pan-Africanistas.
As ideias pan-africanistas começaram a circular pela primeira vez em meados do século XIX nos Estados Unidos, lideradas por africanos do Hemisfério Ocidental. Os pan-africanistas mais importantes no início foram Martin Delany e Alexander Crummel, ambos afro-americanos, e Edward Blyden, um caribenho.
Essas vozes precursoras do Pan-Africanismo enfatizaram as semelhanças entre os africanos e as pessoas negras nos Estados Unidos. Delany, que acreditava que as pessoas negras não poderiam prosperar ao lado dos brancos, advogava pela ideia de que os afro-americanos deveriam se separar dos Estados Unidos e estabelecer sua própria nação. Crummel e Blyden, contemporâneos de Delany, acreditavam que a África era o melhor lugar para essa nova nação. Motivados pelo zelo missionário cristão, ambos acreditavam que os africanos no Novo Mundo deveriam retornar às suas terras natais, convertendo e civilizando os habitantes locais.
Embora as ideias de Delany, Crummel e Blyden sejam importantes, o verdadeiro pai do Pan-Africanismo moderno foi o influente pensador W.E.B. Du Bois. Ao longo de sua extensa carreira, Du Bois foi um defensor consistente do estudo da história e cultura africanas. No início do século XX, ele se destacou entre os poucos acadêmicos que estudavam a África. Sua declaração, feita no início do século XX, de que “o problema do século XX é o problema da linha de cor”, foi proferida com sentimentos pan-africanistas em mente.
Para Du Bois, “o problema da linha de cor” não se limitava apenas aos Estados Unidos e ao seu “Problema Negro”. (Naquela época, era comum muitos nos Estados Unidos se referirem ao problema do status social dos afro-americanos como o “Problema Negro”.) A famosa declaração de Du Bois foi feita com o claro conhecimento de que muitos africanos que viviam no continente africano sofriam sob o jugo do domínio colonial europeu.
Entre os pensadores pan-africanistas mais importantes das primeiras décadas do século XX estava o nacionalista negro nascido na Jamaica, Marcus Garvey. Nos anos após a Primeira Guerra Mundial, Garvey defendeu a causa da independência africana, enfatizando os atributos positivos do passado coletivo dos negros. Sua organização, a Universal Negro Improvement Association (UNIA), contava com milhões de membros, vislumbrando e elaborando planos para um retorno “de volta à África”. A Black Star Line de Garvey, uma companhia de navegação estabelecida em parte para transportar negros de volta à África, bem como facilitar o comércio global negro, foi, em última instância, malsucedida.
Nas décadas de 1920 a 1940, entre os intelectuais negros mais proeminentes que advogavam por ideias pan-africanistas estavam C.L.R. James e George Padmore, ambos originários de Trinidad. Desde a década de 1930 até sua morte em 1959, Padmore foi um dos principais teóricos das ideias pan-africanas. Também influentes eram Léopold Senghor e Aimé Césaire, originários do Senegal e da Martinica, respectivamente. Discípulo de Padmore, Jomo Kenyatta do Quênia também foi uma figura importante no pensamento pan-africanista.
O primeiro Congresso Pan-Africano formal, nomeado como tal, ocorreu em 1919 em Paris e foi convocado por W.E.B. Du Bois. Este encontro foi sucedido por um segundo Congresso Pan-Africano dois anos depois, realizado em três sessões em Londres, Bruxelas e Paris. O marco mais significativo do segundo Congresso Pan-Africano foi a emissão de uma declaração que denunciava a dominação colonial europeia na África, expressando pesar pelas desigualdades raciais e apelando por uma distribuição mais equitativa dos recursos globais. A declaração também desafiou o resto do mundo a criar condições de igualdade nas regiões habitadas por pessoas de ascendência africana ou a reconhecer a “ascensão de um grande estado africano fundado na paz e na boa vontade”.
Após o terceiro Congresso Pan-Africano em 1923 e o quarto em 1927, o movimento perdeu destaque global até 1945, quando um quinto Congresso Pan-Africano foi realizado em Manchester, Inglaterra. Com a liderança pan-africanista transferindo-se predominantemente dos afro-americanos para os africanos na década de 1940, figuras proeminentes como Nkrumah, Kenyatta e Padmore desempenharam papéis destacados nesse congresso, enquanto W.E.B. Du Bois foi o único afro-americano presente.
À medida que muitos países africanos conquistavam a independência nas décadas seguintes à Segunda Guerra Mundial, o foco na unidade africana concentrou-se principalmente nas preocupações do continente. A formação da Organização para a Unidade Africana (OUA) em 1963 solidificou a liderança africana. Embora um sexto Congresso Pan-Africano tenha ocorrido em Dar es Salaam, Tanzânia, em 1974, a União Africana (UA), sucessora da OUA, foi estabelecida em 2002 para promover ainda mais a integração social, política e econômica na África.
Os apelos ao pan-africanismo ainda ecoavam nos Estados Unidos no início do século XXI, mas nessa época o movimento já havia principalmente defendido a unidade dos países africanos, especialmente na África Subsaariana.
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Wanderson Dutch.
Wanderson Dutch
Wanderson Dutch é escritor, dancarino, produtor de conteúdo digital desde 2015, formado em Letras pela Faculdade Capixaba do Espírito Santo (Multivix 2011-2014) e pós-graduado pela Faculdade União Cultural do estado de São Paulo (2015-2016).
Vasta experiência internacional, já morou em Dublin(Irlanda), Portugal, é um espírito livre, já visitou mais de 15 países da Europa e atualmente mora em São Paulo.
É coautor no livro: Versões do Perdão, autor do livro O Diário de Ayron e também de Breves Reflexões para não Desistir da Vida.