Quem tem medo da consciência negra?

Num cenário social onde as estruturas de poder se consolidam cada vez mais em desigualdades arraigadas, a explosão da consciência negra irrompe como um clarão que desnuda as sombras da discriminação sistêmica. Todavia, a elite estabelecida se contorce ante essa claridade penetrante, incômoda e inquisitiva. Lewis R. Gordon, pensador político afro-judeu, lança uma análise lúcida ao demarcar a diferença entre a “consciência negra”, escrita com letra minúscula, e a “consciência Negra”, grafada em maiúscula, uma distinção que reflete graus variados de passividade e de engajamento no enfrentamento das bases do racismo sistêmico.

A consciência negra com minúscula emerge como a mera percepção, um eco das realidades brutais que pessoas negras são forçados a confrontar cotidianamente. É um murmúrio do sistema, que não aspira à igualdade, mas sim à manutenção do statu quo, que favorece os privilegiados. No entanto, essa percepção isolada é insuficiente para desalojar as fundações do preconceito enraizado. A consciência Negra, a forma maiúscula e ativa, emerge como uma entidade que desafia as correntes invisíveis do preconceito e avança destemidamente rumo à metamorfose das circunstâncias.

O despontar da consciência Negra não se limita a um evento singular; em vez disso, é uma jornada sem volta nas histórias das comunidades afrodescendentes globalmente. Gordon, ao rastrear esses momentos de inflexão, destaca as várias manifestações dessa luta. A consciência Negra não se restringe ao aspecto racial, mas entrelaça-se com questões de gênero, classe, ideologia e religião. É um ímpeto atemporal, uma força que resiste, que transcende os grilhões de tempo e espaço, uma voz que se recusa a ser apagada pela cacofonia da inércia.

A reação à consciência Negra, muitas vezes, assume contornos sutis, sorrateiros e, assim, difíceis de detectar. Quando os fundamentos do racismo são questionados, as estruturas de poder reconfiguram-se frequentemente, metamorfoseando-se em formas mais dissimuladas, mas igualmente prejudiciais. Os que se beneficiam das desigualdades sistêmicas percebem a consciência Negra como ameaça, já que ela desafia suas vantagens injustas e os incita a prestar contas.

Movimentos contemporâneos como o Black Lives Matter ecoam como exemplos vivos da consciência Negra em ação. São manifestações coletivas do descontentamento face à injustiça, ao racismo que está entranhado nas instituições e à desvalorização sistemática das vidas negras. Essas mobilizações, enquanto incitam esperança, também encontram resistência e são sujeitas a tentativas de minimização, uma evidência clara de como a consciência Negra desestabiliza os alicerces sobre os quais repousam os poderes opressores.

A pergunta permanece: por que se teme a consciência Negra? A resposta se encontra na relutância em ceder privilégios, na aversão à transformação e no desconforto gerado pelo confronto com uma realidade antes obscurecida. No entanto, essa resistência testifica o vigor da consciência Negra, pois é quando algo efetivamente abala o statu quo que ele reage com mais fúria.

Num mundo que frequentemente prefere desviar o olhar das verdades incômodas, a consciência Negra recusa-se a ser ignorada. Como uma luz incansável, ela revela as feridas ainda supurantes da sociedade, enquanto, simultaneamente, aponta para um caminho de cura e mudança. Assim, enquanto alguns temem a consciência Negra, é precisamente essa tenacidade transformadora que detém a promessa de um futuro mais equânime e justo para todos.

Gostou? Compartilhe.

Wanderson Dutch.

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch

Wanderson Dutch é escritor, dancarino, produtor de conteúdo digital desde 2015, formado em Letras pela Faculdade Capixaba do Espírito Santo (Multivix 2011-2014) e pós-graduado pela Faculdade União Cultural do estado de São Paulo (2015-2016).
Vasta experiência internacional, já morou em Dublin(Irlanda), Portugal, é um espírito livre, já visitou mais de 15 países da Europa e atualmente mora em São Paulo.
É coautor no livro: Versões do Perdão, autor do livro O Diário de Ayron e também de Breves Reflexões para não Desistir da Vida.

apoia.se